sábado, 21 de março de 2020

A regra é a metamorfose




Tem um mamoeiro no quintal.

Eu o vi brotar, crescer e frutificar.

Certo dia, uma geada forte queimou todas as suas folhas. Com a minha brilhante mente racional, pensei: não poderá mais fazer fotossíntese, por certo que esse foi o seu fim.

Mas a natureza que fervilhava dentro dele, fez romper a sua pele em oito pontos. Oito brotos em locais pouco prováveis, que se tornaram oito novos galhos, distribuídos em todo o comprimento do caule. Produz oito vezes mais mamões e, agora, na altura das mãos.

Quem diria, uma aparente morte dando surgimento à uma efervescência de vida.

Lembrei-me, hoje, da quase morte do mamoeiro, quando senti desaparecer parte da minha consciência depois de um esforço físico leve. 

Sentei-me ao lado do mamoeiro para tentar absorver a inteligência da renovação, para sentir a energia da vida fluindo sem medo e sem economia.

Antes mesmo de colocar os olhos na árvore, percebi que o jardim havia me preparado uma nova lição.

Uma borboleta segurando-se firmemente ao casulo do qual havia saído.

Talvez ela não soubesse que depois de abrir as suas asas, não seria mais possível voltar para o espaço pequeno dentro do qual se sentia segura, mas permanecia confinada. Depois do caos, da metamorfose e da expansão, nada mais seria como antes – o que é assustador.

O mundo, como ela conhecia, acabou.

Ela se movimentará outra forma, ela enxergará a vida de outros ângulos, ela sentirá outras necessidades, ela irá se relacionar com outros grupos.

Não poderia ter recebido um presente maior que esse.

Enquanto nos debatemos contra as paredes dos nossos casulos e nos descobrimos grandes demais para espaços tão pequenos, lá fora a vida continua a jorrar com uma potência inimaginável, preparando-nos novas experiências.

Tal qual o mamoeiro e a borboleta, não sabemos que nascemos exatamente para isso e que viemos mais que preparados. Nossos corpos carregam uma inteligência pouco compreendida pelas nossas mentes: possuem códigos que são ativados em momentos chave.

Seguimos impulsionados pela força da vida, que nos impele ao movimento, ao crescimento e, por que não, às dúvidas.

A cada pequena morte, uma metamorfose, um degrau.





Um comentário:

  1. Eu prefiro ser uma metamorfose ambulante ao invés de ter opiniões prontas e acabadas sobre muitas coisa...

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